terça-feira, 19 de julho de 2011

INTROIBO AD ALTARE DEI

“Introibo ad altare Dei” (subirei ao altar do Senhor), este é o lema que elegi para minhas ordenações diaconal e presbiteral. Um lema é uma ideia expressa por uma frase que serve de guia ou de motivação para uma pessoa por alguma razão especial e particular. Subir ao altar do Senhor significa ser eleito por Ele, lugar privilegiado da comunhão, da fraternidade, de pertença à família de Deus. Há alguma razão que possa nos dar mais alegria que isso? Com certeza não!
O padre é aquele que, vestindo-se nobre e dignamente, indica a grandeza e a nobreza do que vai ser celebrado na missa, torna-se um Alter Christus (outro Cristo), apontando-O como o Todo-poderoso, vencedor da morte, Rei do Universo, Senhor dos senhores, Rei dos reis.
Este padre que no Altar, se imola com o Cristo, e não age por si, mas com e pela Igreja, não pode celebrar o santo sacrifício da missa sem estola, pois sem esta é um padre sem o poder sacerdotal investido por Cristo a ele conferido pela Santa Igreja. Assim, quando se reveste da estola, deve rezar em silêncio, cantando com o salmista: “subirei ao altar de Deus, de Deus que alegra a minha juventude” (Sl 42,4).
A alegria de subir ao altar é incomensurável, dado que o espaço físico pode estar destruído, mas basta um sacerdote para que, lá, aconteça o maior milagre da Graça, para que Deus Se faça real e substancialmente presente. Mesmo em meio às ruínas. Mesmo estando tudo destruído, é possível subir ao altar de Deus, que é a nossa alegria. Ali diante do Altar do Senhor, todos os dias, somos convocados a participar da Eucaristia e a difundir a incontida alegria do encontro que se traduz na partilha, no acolhimento e no entusiasmo; consequentemente, a alegre experiência do encontro com Cristo, o louvor e a exultação que brotam do fundo de nosso coração não podem permanecer ocultos. O Amor que brota da Sagrada Eucaristia estrutura a comunidade e a faz participar da gratuidade, da generosidade, da abertura ao ser humano.
Na Eucaristia ouvimos, “felizes os convidados para ceia do Senhor...”, o grande banquete servido no altar pelo próprio Jesus, sendo Ele mesmo este banquete, pelo qual fortalecidos pelos gestos de oração e de serviço percebemos que o Rei dos reis nos convida, pois Ele deseja que em Seu Altar saibamos celebrar, solenizar, entoar, proclamar, salmodiar e cantar todas as maravilhas que Ele opera em nosso ser.
Pela reta participação na Eucaristia, recebemos os grandes frutos da mesma que nos fazem clamar juntos com São Francisco de Assis: “Exulte o céu quando no Altar, nas mãos do sacerdote, está o Cristo, o Filho do Deus-Vivo. Ó, admirável elevação e designação maravilhosa! Ó, sublimidade humilde, que o Senhor do universo, Deus e Filho de Deus, assim se humilha a ponto de esconder-se, para a nossa salvação, em pouca aparência de pão!”.
O padre, pelo sacerdócio ministerial que lhe é conferido pela Igreja e não por seu merecimento, se entrega, se imola, se doa integralmente, toma a cruz. Tomar a cruz significa comprometer-se com Cristo para derrotar o pecado que impede o caminho rumo a Deus, acolher cotidianamente a vontade do Senhor, aumentar a fé, sobretudo diante dos problemas, das dificuldades, do sofrimento.
Por estas e inúmeras outras razões é que com muita alegria e gratidão poderei cantar sempre, “Introibo ad altare Dei”!

HOMILIA NA FESTA DO SAGRADO CORAÇÃO DE JESUS

A devoção ao Sagrado Coração de Jesus inicia-se na própria Sagrada Escritura. O coração é o meio mais lógico para falar do infinito amor de Deus por você. Este amor encontra seu ponto alto com a vinda de Jesus. Tal devoção de um modo visível aparece em dois acontecimentos fortes do evangelho: o gesto de São João, discípulo amado, encostando a sua cabeça em Jesus durante a última ceia (cf. Jo 13,23); e na cruz, onde o soldado abriu o lado de Jesus com uma lança (cf. Jo 19,34). Lá temos o consolo pela dor da véspera de sua morte, aqui, o sofrimento causado pelos pecados da humanidade.
Estes dois exemplos do evangelho nos ajudam a entender o apelo de Jesus feito em 1675 a Santa Margarida Maria Alacoque:
"Eis este coração que tanto tem amado os homens... não recebo da maior parte senão ingratidões, desprezos, ultrajes, sacrilégios, indiferenças...
Eis que te peço que a primeira sexta-feira depois da oitava do Santíssimo Sacramento (Corpo de Deus) seja dedicada a uma festa especial para honrar o meu coração, comungando neste dia e dando-lhe a devida reparação por meio de um ato de desagravo, para reparar as indignidades que recebeu durante o tempo em que esteve exposto sobre os altares; e prometo-te que o Meu Coração se dilatará para derramar com abundância as influências de Seu divino Amor sobre os que tributem esta divina honra e que procurem que ela lhe seja prestada."
O Beato João Paulo II sempre cultivou esta devoção, e a incentivava a todos que desejassem crescer na amizade com Jesus. Em 1980, no dia do Sagrado Coração, afirmou: "Na solenidade do Sagrado Coração de Jesus, a liturgia da Igreja concentra-se, com adoração e amor especial, em torno do mistério do Coração de Cristo. Quero hoje dirigir juntamente convosco o olhar dos nossos corações para o ministério desse Coração. Ele falou-me desde a minha juventude. Cada ano volto a este mistério no ritmo litúrgico do tempo da Igreja."
O aspecto do mistério da salvação que celebramos hoje não é muito diferente do que celebramos há uns dez dias atrás, o domingo da Trindade. "Deus é amor", repete São João, como um refrão, na segunda leitura da missa de hoje. Estas três palavras resumem todo o mistério da união do Pai a seu Filho no seu Espírito comum. Resumem também todo o mistério das relações entre Deus e a humanidade.
Já no AT, o povo hebreu havia percebido como era amado de modo particular por Deus e permanecia fascinado pela gratuidade deste amor, em primeiro lugar, e em seguida, pela fidelidade de Deus a este amor a despeito de todas as infidelidades de seu povo.
São João era fascinado pelo fato de que Deus nos amou primeiro e nos manifestou seu amor enviando-nos seu Filho único a fim de que por ele, tivéssemos a vida em plenitude. Mas isto não lhe era suficiente. Ele tira também daí as consequências para nossa vida de todos os dias, utilizando uma lógica muito simples e sem erro: já que Deus nos amou, devemos não somente amá-lo, mas também amar-nos uns aos outros. E, sempre na mesma lógica, continua: Deus é amor, aquele que PERMANECE no amor, isto é, aquele que PERSISTE no amor, que RESIDE no amor, que é FIEL como o próprio Deus é fiel, esta pessoa permanece em Deus e Deus permanece nela. Esta pessoa é introduzida pelo amor no próprio mistério da vida da Trindade.
Quem quer que ame verdadeiramente sabe que o amor é exigente. O Livro do Deuteronômio enuncia pela boca de Moisés a importância de guardar as ordens, os mandamentos e os decretos prescritos por Deus ou em nome de Deus, uma vez que esta obediência é percebida como uma expressão de amor e de fidelidade. Jesus, no Evangelho, não é menos exigente. É para aqueles que desejam andar em seu seguimento, isto é, tornar-se seus discípulos e viver segundo seu ensinamento, que ele revela os segredos do Pai que permanecem ocultos aos sábios e entendidos. Ele próprio se apresenta como doce e humilde de coração.
O coração é concebido em todas as culturas como o lugar onde residem os sentimentos, a afetividade, o amor. Eis porque, a partir já da Idade Média, místicos como Gertrudes, Catarina de Siena, Matilde, Margarida Alacoque, João Eudes, desenvolvem uma devoção ao Sagrado Coração de Jesus, que não é uma devoção a um órgão físico, mas ao amor divino vivido pelo Deus feito homem. Se esta devoção pôde conhecer em certas épocas expressões talvez mais românticas e sentimentais, como dão testemunho uma vasta coleção de imagens piedosas de gosto duvidoso, esta devoção é essencialmente, na sua intuição primeira, a contemplação do amor de Deus para nós encarnado em Jesus de Nazaré.
Uma vez que ele tanto nos amou, amemo-nos, pois uns aos outros com o mesmo amor exigente, prontos a ir até o dom de nós mesmos e ao dom de nossa vida.
Jesus, manso e humilde de coração! Fazei o nosso coração semelhante ao vosso!