terça-feira, 19 de julho de 2011

HOMILIA NA FESTA DO SAGRADO CORAÇÃO DE JESUS

A devoção ao Sagrado Coração de Jesus inicia-se na própria Sagrada Escritura. O coração é o meio mais lógico para falar do infinito amor de Deus por você. Este amor encontra seu ponto alto com a vinda de Jesus. Tal devoção de um modo visível aparece em dois acontecimentos fortes do evangelho: o gesto de São João, discípulo amado, encostando a sua cabeça em Jesus durante a última ceia (cf. Jo 13,23); e na cruz, onde o soldado abriu o lado de Jesus com uma lança (cf. Jo 19,34). Lá temos o consolo pela dor da véspera de sua morte, aqui, o sofrimento causado pelos pecados da humanidade.
Estes dois exemplos do evangelho nos ajudam a entender o apelo de Jesus feito em 1675 a Santa Margarida Maria Alacoque:
"Eis este coração que tanto tem amado os homens... não recebo da maior parte senão ingratidões, desprezos, ultrajes, sacrilégios, indiferenças...
Eis que te peço que a primeira sexta-feira depois da oitava do Santíssimo Sacramento (Corpo de Deus) seja dedicada a uma festa especial para honrar o meu coração, comungando neste dia e dando-lhe a devida reparação por meio de um ato de desagravo, para reparar as indignidades que recebeu durante o tempo em que esteve exposto sobre os altares; e prometo-te que o Meu Coração se dilatará para derramar com abundância as influências de Seu divino Amor sobre os que tributem esta divina honra e que procurem que ela lhe seja prestada."
O Beato João Paulo II sempre cultivou esta devoção, e a incentivava a todos que desejassem crescer na amizade com Jesus. Em 1980, no dia do Sagrado Coração, afirmou: "Na solenidade do Sagrado Coração de Jesus, a liturgia da Igreja concentra-se, com adoração e amor especial, em torno do mistério do Coração de Cristo. Quero hoje dirigir juntamente convosco o olhar dos nossos corações para o ministério desse Coração. Ele falou-me desde a minha juventude. Cada ano volto a este mistério no ritmo litúrgico do tempo da Igreja."
O aspecto do mistério da salvação que celebramos hoje não é muito diferente do que celebramos há uns dez dias atrás, o domingo da Trindade. "Deus é amor", repete São João, como um refrão, na segunda leitura da missa de hoje. Estas três palavras resumem todo o mistério da união do Pai a seu Filho no seu Espírito comum. Resumem também todo o mistério das relações entre Deus e a humanidade.
Já no AT, o povo hebreu havia percebido como era amado de modo particular por Deus e permanecia fascinado pela gratuidade deste amor, em primeiro lugar, e em seguida, pela fidelidade de Deus a este amor a despeito de todas as infidelidades de seu povo.
São João era fascinado pelo fato de que Deus nos amou primeiro e nos manifestou seu amor enviando-nos seu Filho único a fim de que por ele, tivéssemos a vida em plenitude. Mas isto não lhe era suficiente. Ele tira também daí as consequências para nossa vida de todos os dias, utilizando uma lógica muito simples e sem erro: já que Deus nos amou, devemos não somente amá-lo, mas também amar-nos uns aos outros. E, sempre na mesma lógica, continua: Deus é amor, aquele que PERMANECE no amor, isto é, aquele que PERSISTE no amor, que RESIDE no amor, que é FIEL como o próprio Deus é fiel, esta pessoa permanece em Deus e Deus permanece nela. Esta pessoa é introduzida pelo amor no próprio mistério da vida da Trindade.
Quem quer que ame verdadeiramente sabe que o amor é exigente. O Livro do Deuteronômio enuncia pela boca de Moisés a importância de guardar as ordens, os mandamentos e os decretos prescritos por Deus ou em nome de Deus, uma vez que esta obediência é percebida como uma expressão de amor e de fidelidade. Jesus, no Evangelho, não é menos exigente. É para aqueles que desejam andar em seu seguimento, isto é, tornar-se seus discípulos e viver segundo seu ensinamento, que ele revela os segredos do Pai que permanecem ocultos aos sábios e entendidos. Ele próprio se apresenta como doce e humilde de coração.
O coração é concebido em todas as culturas como o lugar onde residem os sentimentos, a afetividade, o amor. Eis porque, a partir já da Idade Média, místicos como Gertrudes, Catarina de Siena, Matilde, Margarida Alacoque, João Eudes, desenvolvem uma devoção ao Sagrado Coração de Jesus, que não é uma devoção a um órgão físico, mas ao amor divino vivido pelo Deus feito homem. Se esta devoção pôde conhecer em certas épocas expressões talvez mais românticas e sentimentais, como dão testemunho uma vasta coleção de imagens piedosas de gosto duvidoso, esta devoção é essencialmente, na sua intuição primeira, a contemplação do amor de Deus para nós encarnado em Jesus de Nazaré.
Uma vez que ele tanto nos amou, amemo-nos, pois uns aos outros com o mesmo amor exigente, prontos a ir até o dom de nós mesmos e ao dom de nossa vida.
Jesus, manso e humilde de coração! Fazei o nosso coração semelhante ao vosso!

Nenhum comentário:

Postar um comentário